sábado, 2 de abril de 2011

Ministra do Meio Ambiente não abre mão de punir quem desmatou



A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirmou ontem (31/03/11) que não abre mão de punir os produtores rurais que desmataram ilegalmente. O assunto faz parte dos debates em torno do novo Código Florestal, que está em discussão no Congresso Nacional. "O Ministério do Meio Ambiente nunca concordou com anistia a desmatador. A quem cometeu crime ambiental, desrespeitando a lei, não cabe anistia", frisou a ministra, durante debate sobre meio ambiente na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio).Apesar de reconhecer que o tema continua polêmico entre os parlamentares, polarizados entre ruralistas e ambientalistas, Izabella Teixeira mostrou-se mais otimista quanto aos rumos das negociações. Segundo a ministra, existe hoje predisposição de todos os atores para o diálogo e para a construção de convergência, numa perspectiva muito diferente da de 2010. "O clima é outro: é de negociação e muito positivo", afirmou.

O deputado Alessandro Molon (PT-RJ), que também participou do debate, demonstrou preocupação com o formato final do Código Florestal. "O relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), como está hoje, nem de longe me agrada. É preciso debatê-lo mais, modificá-lo em pontos importantes, protegendo as áreas de proteção permanente", disse o deputado.

Molon denunciou a possibilidade de haver um "patrolamento" da bancada ruralista na questão, usando de força para aprovar a matéria, sem maior discussão. Ele afirmou que o risco existe e que a sociedade precisa se mobilizar para evitar que isso aconteça. "É hora de mandar e-mails e cartas, telefonar para seus representantes, cobrando firmeza no enfrentamento da bancada ruralista, que vai pensar em primeiro lugar nos negócios e nos lucros. Devemos pensar na proteção da vida e na preservação do meio ambiente", destacou.

O reitor da PUC Rio, Josafá Carlos de Siqueira, criticou a forma como o Código Florestal está sendo tratado no Congresso. Segundo ele, não se pode fazer modificações contra a preservação do meio ambiente ou que representam retrocesso. "Não tem sentido darmos passos para trás", disse Siqueira.

"O aconselhável é levar em conta a opinião dos cientistas, antes de tomar determinadas atitudes. Redução da área de florestas [nas margens de rios] vai de encontro a todos os estudos que nós temos", criticou o reitor.

FONTE

Vladimir Platonow - Repórter
Nádia Franco - Edição


quinta-feira, 13 de maio de 2010

PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE

RELATO DE UMA HISTÓRIA DE LUTA PELA PRESERVAÇÃO AMBIENTAL



RESUMO EXECUTIVO

O INÍCIO: Da ação individual à ação coletiva. O começo conforme narrado por Darci Bergmann: Em Janeiro de 1977, a uma temperatura ambiente de 40ºC, a cidade de São Borja parecia um deserto de vida. Na rua em que me encontrava, não havia sombra, nem pássaros, nem flores. Sob o sol escaldante tomei uma decisão: Vou iniciar uma campanha de arborização.
Em agosto, escrevi para O JORNAL, periódico local, propondo uma parceria para divulgação de trabalhos na área de educação ambiental que eu já iniciara então. Surgiu assim o projeto Plante Uma Vida - Plante uma árvore.
De uma campanha de arborização, passei a perceber a importância da inserção da comunidade num projeto mais amplo, visto que os problemas ambientais eram complexos. Aceitando convite do Centro Nativista Boitatá, entidade social recreativa, criamos o Departamento de Ecologia, que dirigi de 1978 a 1988, com ação significativa, distribuindo e orientando sobre o plantio de dezoito mil mudas de espécies nativas.

AS DIFICULDADES INICIAIS: Não havia viveiro. Tive que produzir minhas próprias mudas.Utilizava saquinhos de leite e latas de óleo comestível, arrecadadas no lixão e a partir de campanhas nas escolas em troca de mudas. Com amigos, realizamos os primeiros plantios em vias públicas. Não havia consciência preservacionista e os primeiros plantios sofreram ações de vândalos.

OS PRIMEIROS RESULTADOS: No outono e inverno de 1978, já havia em torno de 10.000 mudas no viveiro. Trezentas foram plantadas em vias públicas, com participantes da comunidade que se comprometeram em abrir as covas e cuidar do desenvolvimento da planta. Essa parceria, foi o ponto de partida de um grande projeto que se desmembrou em vários setores da comunidade, com múltiplas formas de atuação, como veremos resumidamente.

PALESTRAS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL, envolvendo escolas, associações de bairros, Igrejas, clubes. Etc, somando mais de quinhentas palestras realizadas inclusive fora do município.

CURSOS DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PARA ADOLESCENTES.

FORMAÇÃO DO CLUBE DE ECOLOGIA VIVA A NATUREZA

Distribuição de 120.000 mudas de mais de 70 espécies nativas no Município. Em 1987, propus a um grupo de amigos a criação da ASPAN ( Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural), consolidando-se a fase de ação coletiva do projeto.

OBJETIVOS:

1) INICIAL : 1977 Implantar campanha de arborização na cidade de São Borja, RS.

2) OBJETIVOS AGREGADOS NO DECORRER DO PROJETO:

2.1) Ações educativas pertinentes à temática ambiental de forma abrangente;

2.2) Envolver a comunidade em um Projeto Ambiental;

2.3) Criação de uma ONG ambientalista;

2.4) Realização de Seminários ambientais.

3) OBJETIVOS DEFINIDOS PELA ASPAN EM 1987

3.1) Educação Ambiental formal e informal, em continuidade aos trabalhos já iniciados.

3.2) Projetos de proteção e recuperação ambiental em parceria com outras instituições.

3.3) Política ambiental a partir de uma estrutura executiva na Prefeitura Municipal.

3.4) Legislação Ambiental: Adaptação das leis municipais para a temática ambiental. Zelar pela aplicação das leis ambientais.

3.5) Realização de seminários ambientais bianuais.

3.6) Distribuição de material informativo sobre o meio ambiente na comunidade: boletins, folhetos, etc...

3.7) Criação de um boletim informativo periódico ( ainda não concretizado).

3.8) Viabilização de uma fundação ambiental.

DESENVOLVIMENTO E METODOLOGIA DE AÇÃO.

TRÊS EIXOS DE AÇÃO.

1.ÁREA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL

1.1.PALESTRAS: Com a fundação da ASPAN, intensificamos a ação pedagógica de educação ambiental no ensino formal e participação em atividades junto a sindicatos e associações de moradores. O nome de seu idealizador e presidente, Darci Bergmann, torna-se referência no município e região em eventos que envolvem a questão ambiental.

1.2.CURSOS: Entre os mais importantes cabe destacar:

1.2.1.CURSO DE ECOLOGIA E MEIO AMBIENTE - Destinado a adolescentes. Realizado em duas edições com total de 40 participantes. Encontra-se em estudo parceria com o governo municipal para outras edições. O curso é dividido em aulas teóricas e práticas.

1.2.2. CURSO DE JARDINAGEM E PAISAGISMO: realizado antes da fundação da ASPAN. Participaram 46 pessoas. Foi dada ênfase à preservação da paisagem local, sua recomposição e as matas ciliares como elemento paisagístico e de preservação. Em decorrência deste curso, um produtor rural recompôs a mata ciliar em trecho do Rio Uruguai, com plantio de 40 mil exemplares de espécies nativas.

1.2.3PROGRAMA RADIOFÔNICO VIVA A NATUREZA: Esse programa de educação ambiental é apresentado desde junho de 1990, em edições de 30 minutos pela Rádio Cultura AM. O programa é pago, sendo mantido com a colaboração de empresas locais. Tem grande audiência. Já foram entrevistadas centenas de pessoas que repassaram experiências relativas ao meio ambiente.

1.3 ROTEIROS EDUCATIVOS

1.3.1. SUB- PROJETO CONHECER PARA PRESERVAR: Tem por objetivo a identificação de locais que, por sua natureza, possam servir como áreas de turismo ecológico, ou reflexão sobre a temática ambiental. São realizadas excursões, com diversos segmentos sociais, identificando-se áreas com mata ciliar, nascentes de rios, cascatas, áreas de desertificação, experiências de arborização, reciclagem, etc. É um projeto permanente, sem cronograma definido.

1.3.2. SUB-PROJETO DE REFLORESTAMENTO: Experiência com reflorestamento, na Chácara Itaperaju, localizada próxima à área urbana do município, em uma extensão de 7,7 ha. Mais de 400 espécies arbóreas nativas e exóticas, plantadas a partir de 1978, abrigando hoje espécies de animais silvestres como tatus , bugios( Alouata caraya), graxains, diversas espécies de aves, entre outras transformando-se em um acolhedor habitat. A cada ano mais espécies aparecem, propiciando acompanhamento da capacidade regenerativa de área devastada, com a contribuição do ser humano.

2- RELAÇÕES INSTITUCIONAIS E OUTROS PROGRAMAS

2.1. SUB-PROJETO 10 MIL IPÊS:

O Ipê roxo (Tabebuia avellanadae) é a árvore símbolo do Município desde 1980. A ASPAN propôs-se a plantar 10 mil exemplares dessa espécie em diversos locais da cidade e zona rural. Do total previsto, 8 mil exemplares já foram plantados.

2.2. CIRCUITO DOS IPÊS

Prevê o plantio de espécies de ipê roxo e ipê amarelo nas BRs de acesso à cidade e avenidas perimetrais. As avenidas Leonel de Moura Brizola, Presidente João Goulart e trecho da BR 472 já receberam centenas de exemplares. As queimadas, mal uso de ceifadeiras e vandalismo obrigaram a freqüentes reposições de mudas. Por sugestão da ASPAN, o Executivo Municipal, em decreto, criou o Circuito dos Ipês, prevendo a ampliação do plantio em outras artérias e logradouros públicos.

2.3 PLANO DIRETOR DE ARBORIZAÇÃO URBANA- A ASPAN preparou minuta de projeto para o PLANO DIRETOR DE ARBORIZAÇÃO URBANA, a ser desenvolvido em parceria com a Prefeitura Municipal e apoio de outras entidades.

O prazo máximo para a execução é de seis anos, paralelamente ao manejo da arborização já existente. Haverá necessidade de contratação de pessoal, tais como estagiários e monitores que serão treinados para esse fim. Esses atuarão no levantamento preliminar, rua por rua, em todos os bairros. Na fase seguinte começará o plantio propriamente dito. A legislação municipal de 1991 regulamenta o plantio e as podas das árvores em vias públicas. O plano diretor visa complementar o que já é previsto na citada regulamentação.

2.4. CONSELHO MUNICIPAL DE RECUPERAÇÃO E DEFESA DO MEIO AMBIENTE - A ASPAN teve participação ativa no referido Conselho, quando da elaboração do Plano Ambiental do Município.
Uma antiga reivindicação da nossa entidade foi concretizada: trata-se da criação da Secretaria Municipal do Meio Ambiente. Esperava-se que a partir daí o Poder Público Municipal conseguisse estabelecer compromissos e resultados efetivos na área de proteção ambiental. A atual administração municipal (2005-2008) mudou a estrutura, reunindo a pasta da Agricultura com o Meio Ambiente.

2.5. CONVÊNIO COM A FEPAGRO
A FEPAGRO - Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária mantém em São Borja uma Estação Experimental Fitotécnica. Por alguns anos foi efetuada parceria com a FEPAGRO-Cereais. O convênio não foi renovado, por dificuldades estruturais da FEPAGRO.

2.6. SEMINÁRIO AMBIENTAL :
A primeira edição foi realizada em maio de 1998, com a participação de 400 pessoas. Oito Universidades estavam representadas e mais de 50 municípios. A ASPAN contou com o apoio do Sindicato Rural de São Borja, da Urcamp (Universidade da Região da Campanha) e da Prefeitura e Câmara Municipal de São Borja. Pretendemos que as próximas edições tenham abrangência na área do Mercosul.
A segunda edição foi realizada de 3 a 5 de Junho de 2004, nas dependências da Comunidade Evangélica Luterana, no Bairro da Pirahy.
Com isso solidifica-se um dos objetivos do PROJETO PLANTE UMA VIDA PLANTE UMA ÁRVORE: criar-se um fórum permanente de discussão e busca de soluções nas questões ambientais. Além do caráter didático desses seminários, espera-se que eles possam traçar diretrizes para os municípios, estados e países.
O Rio Uruguai que nos divide politicamente como fronteira, nos une como referência geoambiental.
Outros seminários têm sido realizados por instituições diversas, sem a coordenação da ASPAN.

2.7. SEDE PRÓPRIA E CENTRO DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL.
Em 1999 foi adquirida uma área de 3,3Ha contígua à Estação Experimental Fitotécnica, com recursos da Fundação Francisco, sediada em Brasília. Nessa área pretende-se desenvolver um trabalho integrado de Educação Ambiental e implantação de um horto florestal com espécies nativas da região.
Com recursos do Projeto SEMEAR, o horto florestal já está em implantação.
A implantação do Centro de Educação Ambiental, com aulas teóricas e práticas, é mais um dos objetivos que nortearam o projeto Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore e dependerá do aporte de recursos.

3.LEGISLAÇÃO AMBIENTAL

3.1.ELABORAÇÃO DE LEIS AMBIENTAIS:
No período em que Darci Bergmann atuou como vereador, por duas legislaturas, foram aprovados vários projetos de lei de interesse ambiental, tais como:
O que institui a espécie botânica Tabebuia avellanadae família Bignoniaceae, como árvore símbolo do Município; o que instituiu a espécie Furnarius rufus (João de barro), família Furnaridae, como ave símbolo do Município; a Lei Municipal dos Agrotóxicos; a lei que proíbe corte de exemplares arbóreos nela especificados, a lei nº 1046, de 1981, que proíbe o tabagismo em determinados locais, entre outras.
A ASPAN, em 1989, participou da elaboração da Lei Orgânica do Município, apresentando a minuta do capítulo de Ecologia e Meio Ambiente.
Em 1991, a convite do então prefeito, elaboramos proposta de regulamentação de dispositivos da LOM (decretos 3489/91 e 3573/91), sobre arborização urbana. Hoje estão incorporados na lei complementar 24/2001. A Lei Complementar 24/2001 compilou a maior parte das leis e decretos municipais já mencionados e dispositivos de leis estaduais e federais que surgiram posteriormente e foram transformados em projeto de lei pelo então vereador Antônio Veiga Machado, com apoio do bel. Gastão Ponsi, sócio da ASPAN.

3.2.DIVULGAÇÃO:
Diversos textos legais foram divulgados ao grande público pela ASPAN, especialmente o Código Florestal Federal (lei 4.771 de 15/09/65), a Lei de Proteção à Fauna (lei nº 5.197/67), Lei Federal dos Agrotóxicos (lei 8.102), além de outras.

3.3. AÇÕES JUDICIAIS

3.3.1 - CASO ICAMAQUÃ - SANGA FUNDA
Em 1989, a ASPAN recebeu denúncia de desmatamento em área de preservação permanente às margens do Rio Icamaquã, junto à foz da Sanga Funda, no Município de São Borja. Após vistorias e filmagens aéreas, foi encaminhada representação ao Ministério Público. Diante da gravidade da situação, o MP abriu inquérito, requerendo ação processual junto ao PJ. Desde então, até abril do ano de 2001, a ASPAN assessorou o MP. A ação resultou em acordo judicial onde os réus concordaram em: a) Recuperação das áreas desmatadas, respectivamente de 20,5 e 31 ha;
b) Auxiliarem financeiramente a ASPAN em projetos de arborização comunitária e educação ambiental. Em decorrência, surgiu o projeto SEMEAR.
O fato teve tal repercussão, que outros desmatamentos deixaram de ser consumados. Isso trouxe o respeito à nossa entidade ambientalista. Houve a participação decisiva nessa ação da Juíza de Direito Mara Lúcia Cóccaro Martins, que deu prioridade ao processo.

3.3.2 A QUESTÃO DO SÃO DONATO- Em 12/03/1975, Euclides Trichez, então governador do Rio Grande do Sul, pelo decreto 23.798, criou a Reserva Biológica de São Donato, entre outras. São mais de 3 mil ha de banhados, campos e matas, a 40 km de São Borja, nos Municípios de Itaqui e Maçambará. A área é cortada pela BR 472. O que parecia um ato ecológico do governador transformou-se em uma grande batalha desde então. De um lado, ecologistas como Antônio Gutierrez (in memorian), Rui Perez Antunes e Erlon Benites, de Maçambará; Gastão Ponsi, Darci Bergmann, Mario César Dutra Lago, Antonia Senhorinha Alves (in memorian), Antonio de Oliveira Alves, Amauri Parcianello, entre outros de São Borja. De outra parte, proprietários lindeiros e invasores na parte das matas. Eram intensas as drenagens e desmatamentos. Até uma draga do DNOCS trabalhou no local, abrindo valos, à revelia do Decreto. Com o rebaixamento do nível das águas, os fazendeiros avançaram as cercas, adentrando na reserva, com criação de gado e lavoura de arroz. A fauna, rica em espécies de aves (algumas oriundas da Patagônia), répteis como o jacaré-de-papo-amarelo (Cayman latirostris), mamíferos como capivaras, ratão-do-banhado, entre outros animais, teve drástica redução. Foram feitos abaixo-assinados, um deles com mais de duas mil assinaturas, entregue ao governador pelo ambientalista José Antonio Lutzenberger. Foram realizadas moções nos parlamentos municipais e Estadual de apoio à Reserva . Nada parecia surtir efeito, tal a pressão dos interessados na área. Os governos estaduais que se sucederam calaram diante dos fatos. Convém lembrar que era época do PRÓ–VÁRZEAS, um programa federal que foi fértil em corrupção pelo desvio do dinheiro público e danos ambientais.
Em 1997, o advogado da ASPAN, Gastão Ponsi, reestudou a questão. Daí entrou com ação civil pública contra o Estado do Rio Grande do Sul. Em 03/10/97, a juíza de direito Drª Rosmari Girardi, proferiu sentença histórica, condenando o Estado a tomar as medidas para a recuperação e implantação definitiva da Reserva Biológica de São Donato. O Tribunal de Justiça do Estado manteve a sentença inicial por unanimidade.
Em 1999, técnicos do Estado sobrevoaram a área com duas aeronaves, fotografando, filmando e fazendo levantamento com GPS. Uma batalha ainda não encerrada, de 25 anos, parecia encaminhar-se para um desfecho de sensatez ambiental. Foram anunciados recursos oriundos de termo de ajustamento entre o Estado e a REFAP para o início da demarcação da Reserva e a indenização dos proprietários, quando coubesse. São Borja teve até um escritório da SEMA, mantido com os recursos da REFAP. Ainda no governo Olívio Dutra, os recursos anunciados para a Reserva Biológica de São Donato foram, em sua maioria, destinados a outras unidades de conservação, frustrando a expectativa dos ambientalistas da região. Tudo voltou à estaca zero, apesar de existir sentença transitada em julgado, obrigando o Estado a implantar a Reserva.
Nesse longo tempo foram reunidos dados num amplo dossiê, com fotografias, filmes, notícias e artigos de jornais, manifestos e estudos técnicos sobre a Reserva Biológica de São Donato. Muitos companheiros desistiram da luta, em função de desgaste pessoal, ameaças e até pela descrença nas instituições.
A situação da Reserva hoje é deplorável, mas não irreversível. Certamente nos anos vindouros, as gerações futuras entenderão o significado desses mananciais de vida e continuarão a luta encetada. Foi assim na Flórida, com os Everglades, alagados drenados para o cultivo agrícola e que salinizaram as águas. Agora, os norte–americanos gastam fortunas tentando reverter esse quadro de degradação ambiental, mercê de modelos imediatistas de exploração dos recursos naturais. Foi assim em outros países. Como lá, aqui haverá de imperar o bom senso, ainda que passem gerações.

NOVOS RUMOS
As ações geradas por uma iniciativa individual tiveram desdobramentos com a criação da ASPAN e o envolvimento da comunidade. Agora, impõem- se novos desafios, entre eles:

ESTRUTURAÇÃO DA ASPAN
Passa pela profissionalização de algumas pessoas. Até agora todos os trabalhos foram baseados no voluntariado, com sacrifícios até financeiros de alguns abnegados. Os novos projetos em andamento só terão êxito se atendida essa premissa.
Mesmo com todas as dificuldades muitas tarefas ainda serão voluntárias. Não há mais como voltar no processo.

CRIAÇÃO DE UMA FUNDAÇÃO AMBIENTAL
Esse é um antigo sonho do idealizador do Plante uma Vida, Plante uma Árvore, engenheiro agrônomo Darci Bergmann. Esta fundação teria sua ação mais voltada para o conservacionismo, administrando áreas representativas dos ecossistemas da região. Os primeiros contatos já estão sendo feitos para a identificação de áreas especiais. A acelerada descaracterização da paisagem impõe urgência na questão. Não podemos esperar só dos governos a criação de parques e reservas naturais.
Cabe lembrar que essas áreas protegidas, além de bancos genéticos, servirão como local de estudos para as atuais e futuras gerações.
Os empresários e pessoas da comunidade são convidados a refletirem sobre esse tema e podem tomar iniciativas para que esse objetivo seja alcançado. A Fundação poderá reunir vários instituidores. É sabido que empresários e proprietários rurais conscientes já são receptivos à idéia, mas ainda faltam ações mais efetivas.

PAPEL IRRADIADOR DA ASPAN
Desde sua fundação, a entidade tem procurado fomentar a criação de ONG’s ambientalistas. Foi assim que surgiu com o nosso apoio a AIPAN (Associação Itaquiense de Proteção ao Ambiente Natural). Também o grupo Comandos em Defesa da Natureza, semelhante aos grupos de escoteiros, hoje com 70 crianças e adolescentes e tendo sede própria, teve apoio inicial do engº agrº Darci Bergmann, ainda quando no Departamento de Ecologia do Centro Nativista Boitatá. Trabalhar nas entidades associativas, estimulando práticas e compromissos de proteção ambiental será um papel importante da ASPAN, como já vem ocorrendo. A formação de multiplicadores ambientais, nos cursos junto à sede própria, serão de importância estratégica. Até trabalhadores de empresas e órgãos públicos poderão receber novos conhecimentos sobre a temática ambiental. Assim, serão importantes na implantação de medidas práticas de desenvolvimento sustentável.
Para citar um exemplo de como uma ação gera outra, irradiando-se nos diversos segmentos do tecido social, temos a área cultural e artística. Faz alguns anos, desencadeamos campanha de preservação dos nossos riachos. Uma fita de vídeo conseguida junto ao Instituto Goethe, em Porto Alegre, tinha, entre outros, o tema riacho, na visão ecológica. Passamos o material em várias escolas. Certo dia, fizemos uma palestra com pessoas de diversos setores da comunidade. Convidamos também compositores e intérpretes da música nativista. Depois da apresentação, sugerimos que os compositores presentes fizessem canções baseadas no tema proposto. Salvador Lamberty compôs a canção Riacho, interpretada por Cezar Lindemeyer e foi uma das finalistas da 49ª edição da Sentinela da Canção Nativa, de Caçapava do Sul, RS, nov,1997). Outros artistas estão apresentando canções que falam dos temas ambientais, como Mano Lima, Telmo de Lima Freitas, Jorge Dornelles, entre outros, a pedido da ASPAN.
Importante salientar que várias escolas já possuem grupos interdisciplinares de meio ambiente. Promovem debates, palestras, gincanas, etc. Tivemos papel decisivo nessa área e é com alegria que vemos a evolução desse trabalho. São as sementes que foram semeadas alguns anos atrás, ainda antes do surgimento da ASPAN, quando os professores de hoje assistiam às primeiras palestras do Projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore.
Essa força irradiadora da ASPAN e seus voluntários deverá ser mantida e ampliada. Com a estrutura administrativa em novos moldes e com a criação do Centro de Educação Ambiental não temos dúvidas de que os resultados serão ainda mais expressivos.

RESULTADOS
Decorridos 31 anos do PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE os resultados são evidentes. Há aqueles efeitos difusos que permeiam os diversos segmentos sociais e que não se visualizam num primeiro momento. Fazem parte da consciência ecológica e são base da massa crítica. Este é o resultado maior do nosso projeto e é perceptível também pelos efeitos quanti e qualitativos que afloram, com veremos resumidamente:

1) O VERDE URBANO: Desde o início em 1977, a cidade aumentou a área verde. De algumas centenas de árvores em vias públicas, saltamos para em torno de 10 mil exemplares hoje. Ainda há um déficit de mais ou menos outro tanto. Ocorre que novas ruas foram abertas e as avenidas perimetrais ainda não foram arborizadas. Nos terrenos particulares também aumentou a arborização, diversificada , inclusive com frutíferas nativas. Isso recompôs a avifauna local. Muitas espécies retornaram por encontrarem alimento e abrigo. Até bugios aparecem na área urbana. As podas são mais amenas, obedecendo a critérios mais ecológicos.
Em 1981, na Vila Goulart, o Plante Uma Vida, Plante Uma Árvore arborizou uma área em parceria com os moradores. Tirou-se o lixo do local e hoje é uma praça cheia de verde e árvores nativas. Os moradores receberam também quatrocentas mudas de espécies frutíferas para melhoria da sua alimentação.

2) ZONA RURAL: O projeto agiu em três frentes na zona rural .

2.1. A Questão dos Agrotóxicos: foram dezenas de palestras conscientizando proprietários e trabalhadores sobre manejo integrado de pragas, cuidados com o manuseio dos agrotóxicos e descarte correto das embalagens. As melhorias são perceptíveis, ano após ano, com a diminuição dos casos de intoxicação aguda. Diminuíram os casos de embalagens abandonadas sem critério.

2.2 Queimadas: Nos campos nativos utilizava-se o fogo para queimar a matéria fibrosa, permitindo a rebrotação dos pastos. Os agricultores queimavam a resteva para facilitar a aração. Criou-se um círculo vicioso com reflexos impactantes sobre o meio ambiente. Desde 1977, com as campanhas sistemáticas que promovemos, observou-se a diminuição das queimadas, recompondo boa parte da flora e da fauna. O projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, através da AEASB-Associação dos Engenheiros Agrônomos de São Borja, promoveu cursos de conservação do solo, com ênfase no plantio direto. Também cursos de Jardinagem e Paisagismo foram realizados.

2.3. Arborização na Zona Rural: As palestras mostraram a importância da mata ciliar e a recomposição desta em áreas críticas. Houve melhoria notável.
As escolas rurais trabalharam o tema e receberam mudas de espécies nativas da região. Entre 1977 e 1987, mais de 100 mil mudas de espécies diferentes foram distribuídas entre a cidade e a zona rural. A partir daí a ASPAN desencadeou outras ações nessa área. Fizemos inclusive semeadura direta nas margens das BRs, visando o lado educativo e os resultados aparecem em vários trechos.

2.4 Centro Nativista Boitatá: Essa entidade de cunho tradicionalista tem em torno de 1300 associados. No seu primeiro baile em 19/09/ 1978, no decorrer da Semana Farroupilha, levamos o PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE a participar com uma ação inédita. Foram colocadas 2 mil mudas nativas sobre as mesas e mais duas mil ficaram no saguão. Após uma apresentação do Patrão Antonio Rodrigues Aguilar e do Diretor do Departamento de Ecologia, Darci Bergmann, o 1º Baile Ecológico do Movimento Tradicionalista Gaúcho foi iniciado. Assim foi até 1988, em cada edição da Semana Farroupilha, totalizando 18 mil mudas distribuídas, atingindo cidade e interior. A idéia foi seguida por vários CTG’s no Estado. Muitos freqüentadores preservaram os capões de mato nas suas propriedades e arborizaram-nas em parte. Foi um trabalho com resultados gratificantes, pois hoje o MTG - Movimento Tradicionalista Gaúcho estimula as entidades filiadas a realizarem projetos de preservação ambiental.

3- EDUCAÇÃO AMBIENTAL

3.1. Na rede escolar:
Uma geração de professores participou de palestras que hoje se multiplicam em ações nas escolas. A educação ambiental é um objetivo permanente, atividade cotidiana e de perseverança. Todas as escolas estaduais e municipais e cursos superiores foram trabalhadas pelo nosso projeto. Muitas escolas também receberam mudas de espécies nativas, que nem sempre prosperaram por problemas estruturais.

3.2. Aspectos informais:
Com a Igreja Evangélica de Confissão Luterana fizemos parceria informal. Por um bom tempo acompanhamos o Pastor nas suas andanças pela região. Após os cultos fazíamos palestras sobre meio ambiente.
Outra estratégia para palestras no interior do Município foi a de aproveitar os bailes nos galpões comunitários. As palestras precediam o baile e com isso garantia- se um público variável.

3.3. Viva a Natureza:
Este é o nome do programa de rádio, de educação ambiental, no ar desde 1990 na Rádio Cultura AM de São Borja. O nome foi derivado do Clube de Ecologia mantido por 20 meninas adolescentes que funcionou nos anos de 1990 a 1992. O programa Viva a Natureza foi levado ao ar até 2002.
Com o programa fecha-se o leque de ação educativa envolvendo todos os setores sociais.

4. Resultados Institucionais:
A ASPAN foi reconhecida junto à comunidade local. Colaborou como assistente do Ministério Público, numa época em que não havia a PATRAM, nem a estrutura de licenciamento ambiental do Município. Na verdade antecipou-se espontaneamente em algumas questões. As parcerias se solidificam e surgem a cada dia novas propostas de trabalho e ações a serem desenvolvidas.

5. Outros resultados:

5.1. Coleta seletiva do lixo
Houve uma experiência de 1990 a 1992 em alguns bairros da cidade com bons resultados. Inexplicavelmente, a partir de então, foi suspenso o projeto-piloto. A ASPAN vem exigindo uma postura da Prefeitura pelo retorno da coleta seletiva, inclusive com recolhimento separado do lixo tóxico (pilhas de lanterna, lâmpadas fluorescentes, entre outros). Em 2003, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente, com apoio da ASPAN e patrocínio de empresas locais, elaborou manual sobre reciclagem. É entendimento da entidade que a coleta seletiva deve ser incentivada a partir do gerador dos resíduos, dando-lhe as informações necessárias, daí o manual. Num segundo momento, parte-se para a coleta seletiva, incluindo-se os catadores como atores do processo. De certa forma, hoje em torno de 20% dos domicílios já separam os resíduos nas frações lixo seco e orgânico, facilitando a tarefa dos catadores. Estima-se em dois mil domicílios que já aproveitam os resíduos orgânicos realizando a compostagem para posterior aproveitamento no cultivo de hortas, pomares e plantas ornamentais.
O projeto SEMEAR vem dando continuidade nesses trabalhos

5.2. Mata ciliar no Mangrulho
Neste local, às margens do Rio Uruguai no Primeiro Distrito de São Borja, o então proprietário e sócio da ASPAN, Frederico Isbrecht, plantou quarenta mil exemplares de árvores de diversas espécies, a maioria nativas. Hoje, com as árvores já em grande porte, diversas espécies da fauna se fazem notar.

5.3. Sítio Itaperaju
De uma área depauperada pelas queimadas e erosão do solo, conseguiu-se a partir de 1978 uma recomposição florística espetacular, com centenas de espécies arbóreas e arbustivas, nativas e exóticas. Hoje, centenas de pessoas, especialmente escolares, percorrem as trilhas no local, em grupos agendados prèviamente.

5.4. O visual dos ipês
Os ipês plantados a partir de 1977, mostram toda a sua beleza nas florações de julho a agosto. Elevam o astral das pessoas e causam admiração nos visitantes; muitos desses atraídos a São Borja por ser Terra dos Presidentes.

5.5 Reserva Particular do Patrimônio Natural:
O ex-presidente da AGAPAN e sócio da ASPAN, Celso Aquino Marques, com seus familiares, criou a primeira RPPN no Município. Possui área de 135 ha de campos e matas, às margens do rio Butuí, no Rincão de São Lucas, 1º distrito de São Borja.

CONCLUSÃO
As ações desenvolvidas até aqui foram múltiplas, interpenetrando todo o tecido social, com amplo apoio comunitário. De um momento de indignação em 1977 a uma ação coletiva, já se passaram mais de trinta anos. O que motivou o engº Agrº Darci Bergmann foi a emoção. No desenvolvimento das atividades, mostrou-nos que não é preciso ser doutor em Ecologia para fazer ações voltadas à preservação ambiental. Mas é preciso entregar-se de corpo e alma a uma causa. Muitas críticas foram ouvidas. Aos poucos deram lugar ao apoio. Num certo dia, nos primórdios do projeto, Darci e equipe foram jogar sementes de espécies diversas às margens das BRs. Houve quem risse daquele gesto. A idéia era imitar a natureza, que pelo vento, água e animais também semeia. Onde o fogo não apareceu, algumas sementes germinaram e trechos estão arborizados. Todos os anos, esses mesmos semeadores repetem o ritual para reavivar os antigos ideais. Esses são os exemplos que ficam na memória coletiva.
Por essas ações, em 1999, o Projeto PLANTE UMA VIDA, PLANTE UMA ÁRVORE, foi premiado em votação dos leitores, pela conceituada revista Natureza, na categoria Preservação da Flora. (Até aqui narrado por Darci Bergmann, na Semana do Meio Ambiente – Junho de 2008 )

O projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, começou com uma carta escrita pelo engenheiro agrônomo Darci Bergmann, em 03/08/1977, no semanário O JORNAL, indignado com a precária arborização da cidade de São Borja-RS. Na missiva propôs algumas ações. Foi, então, convidado pelos diretores de O Jornal a fazer matérias de interesse ecológico, resultando na campanha Plante uma Vida, Plante uma Árvore. O Jornal foi desativado, mas Darci Bergmann levou a termo a campanha, transformando-a num projeto pessoal de iniciativas na área ambiental, motivando pessoas. Em cada entidade que Darci Bergmann participava propunha ações ambientalistas, todas elas enquadradas com o nome de Plante uma Vida, Plante uma Árvore, resultando em 1987, com a criação da ASPAN-Associação São Borjense de Proteção ao Ambiente Natural, nas dependências da Câmara de Vereadores.
Segundo Bergmann, o projeto Plante uma Vida, Plante uma Árvore, foi o precursor do ambientalismo em São Borja e será levado a termo até o último dia da sua existência física.









quinta-feira, 29 de abril de 2010

DISPLISCIÊNCIA GERA NULIDADE

Por Maria Tereza Jorge Pádua

Maria Tereza Jorge Pádua é engenheira agrônoma e fundadora da Funatura, membro do Conselho da Fundação O Boticário de Proteção à Natureza e da comissão mundial de Parques Nacionais da UICN.



28/04/2010, 10:53

Levamos mais um grande susto estes dias com a decisão judicial de considerar a caducidade do decreto que estabeleceu o Parque Nacional de Ilha Grande, no Paraná, com 78.800 hectares. Se a moda pegar e o precedente ficar estabelecido, pelo menos a metade dos parques nacionais, estações ecológicas e reservas biológicas, entre outras unidades de conservação serão extintas, pelo simples fato de carecerem de regularização fundiária. Ou seja, que o esforço gigantesco desenvolvido por décadas de lutas e sacrifícios de alguns governantes e de milhares de pessoas, para deixar um pouco do patrimônio natural do Brasil para as gerações futuras pode ir pelo ralo, provocando sua rápida e irremediável destruição.

Por causa desta histórica e até folclórica displicência dos órgãos responsáveis pela administração das unidades de conservação federais; pela sua morosidade em se usar os recursos das compensações ambientais para fins de compra de terras, bem como outros recursos; e pela absoluta falta de prioridade que este e outros governos outorgam a conservar algo do patrimônio natural nacional, chega-se a 2010, com a ameaça representada pela sentença, do Juiz Federal Nicolau Konkel Junior, que reconhece a caducidade do Decreto s/nº de 30/09/97, que criou o Parque Nacional da Ilha Grande.

"Nada da contestação do IBAMA comoveu o Juiz, pois a verdade nua e crua é que o IBAMA, não desapropriou os proprietários de parte da área do Parque Nacional, desde seu estabelecimento há 13 anos". 

Venhamos e convenhamos que até mesmo um decreto sem número, como foi no caso deste Parque, já é algo estranho. Parece descaso. Mais significativo, ainda, é que o mesmo decreto de criação declara de utilidade pública a área do Parque Nacional. O erro já começou por aí. Decreto de criação deve ser só de criação. A declaração de utilidade pública deve estar em outro decreto, em separado. Muitos advogados até do IBAMA, confundem os dispositivos. É óbvio que decretos de declaração de utilidade pública caducam em cinco anos.

Porém os decretos de criação de unidades de conservação não caducam, tendo em vista o dispositivo constitucional (artigo 225,§ 1°, item III da Constituição Federal), que diz claramente que qualquer supressão ou alteração de uma unidade de conservação estabelecida, só poderá ser feita através de lei. Senão vejamos, no seu capítulo VI “Do Meio Ambiente” o artigo 225 reza:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

II - preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;

III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;...

A decisão do Juiz responde a uma ação civil pública da Colônia de Pescadores Z13, que é, portanto a autora do processo. O IBAMA, réu no processo, se defendeu com forte argumentação, também. Dentre os tópicos de sua defesa prevalecem: a contestação da validade legal da caducidade do decreto de criação e ainda; que a União não retirou os moradores da área; a falta de documentação das partes para o fim de desapropriações, com pessoas pleiteando indenizações indevidas; que está executando o plano de manejo do referido Parque Nacional; que houve consultas prévias para a confecção do Plano de Manejo. Ressalta ainda que o decurso do prazo de 5 anos, não causou prejuízo para a futura implementação do plano, pois o artigo 28 da Lei nº 9.985 de 2000 que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação, conhecida como Lei do SNUC disciplina as atividades e obras nas unidades de conservação, até sua efetiva implementação. O SNUC tem artigos que regem sobre a criação de unidades de conservação e não sobre sua implementação.

Nada da contestação do IBAMA comoveu o Juiz, pois a verdade nua e crua é que o IBAMA, não desapropriou os proprietários de parte da área do Parque Nacional, desde seu estabelecimento há 13 anos. Talvez esse juiz, como muitos brasileiros queiram forçar a implantação das unidades de conservação estabelecidas por decretos e logo, em geral, atiradas a sua própria sorte. Impedir os reais proprietários do uso de suas terras ainda não indenizadas parece mesmo um confisco.

Embora os órgãos públicos responsáveis pelas unidades de conservação do país vão recorrer e possivelmente ganhar a causa, enquanto isso não finalizar, prevalece a sentença do Juiz Federal, com todas suas nefastas e até graves conseqüências na prática.

Além do fato básico da argumentação do Juiz, ou seja, a falta de desapropriações oportunas, tudo indica que ocorreu um enorme vácuo entre o Poder Judiciário e os técnicos do Poder Executivo. Parece, pelo publicado, que sequer informaram adequadamente ao judiciário que no Parque Nacional de Ilha Grande há muitas terras públicas, inúmeros processos de desapropriações em andamento e alguns com fraudes já constatadas.

"Os recursos para a construção de apenas uma hidroelétrica de porte médio, ou para a compra de uns poucos aviões de caça, ou para a reforma de alguns estádios de futebol, seriam mais que suficientes para se comprar todas as propriedades particulares dentro de todas as áreas declaradas como unidades de conservação"

A solução do problema parece relativamente fácil: os órgãos responsáveis, o Ministério do Meio Ambiente e o ICMBio, devem se estruturar para fazer as compras, indenizações e desapropriações necessárias para que o país realmente venha a ter um Sistema Nacional de Unidades de Conservação, implementado, bem manejado, prestando serviços à sociedade e respeitado. Precisa-se da prioridade política e de recursos financeiros, que são a mesma coisa. Enfim o Brasil precisa sair do muro e resolver se quer mesmo unidades de conservação ou não. Não é possível que o Governo atual pretenda nos foros internacionais ser um campeão da conservação das florestas e da biodiversidade e, ao mesmo tempo, arriscar a perder grande parte das suas unidades de conservação por inércia. Isso não aconteceu até agora em nenhum país do mundo.

Que a efetiva implementação das unidades de conservação federais nunca foi uma prioridade governamental é bem sabido. Basta lembrar que os recursos para a construção de apenas uma hidroelétrica de porte médio, ou para a compra de uns poucos aviões de caça, ou para a reforma de alguns estádios de futebol, seriam mais que suficientes para se comprar todas as propriedades particulares dentro de todas as áreas declaradas como unidades de conservação de proteção integral no nível federal. Mas, na verdade, o governo tem outras opções a sua disposição para acabar com a situação absurda e arriscada. Para isso o tema da regularização fundiária das unidades de conservação deve se converter em uma verdadeira prioridade da administração e não mais continuar a colocar o tema sob o tapete, como até agora.

Tomara que este grave episódio sirva de alerta aos responsáveis atuais pelas unidades de conservação federais, que são o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Ministério de Meio Ambiente. Não se pode continuar ignorando o maior problema do sistema federal, qual seja o da regularização fundiária das unidades de conservação já estabelecidas oficialmente. Movam-se, por favor. Do contrário vamos ter um país sem unidades de conservação, tendo em vista o andar da carruagem.

 Fonte: http://www.oeco.com.br/
 Acessado em 29/04/2010

sábado, 10 de abril de 2010

ORAÇÃO PELA TERRA

Por Darci Bergmann


Obrigado, Senhor, por nos ter concedido o dom da Vida.

Obrigado, Senhor, por nos ter dado como morada este Planeta, a nossa Terra, verdadeira jóia do sistema solar.

Obrigado, Senhor, por nos ter permitido a companhia de outras formas de vida, que se apresentam em milhões de espécies.

Senhor, todo o Universo faz parte da Vossa grandiosa obra. E aqui, nesta linda querência planetária, permitistes que nossos espíritos, Vossas criaturas eternas, encontrassem morada. Há bilhões de anos a Vida se fixou aqui em formas tão surpreendentes, que evoluíram e se adaptaram às condições dos elementos organizados por Vós e banhados pela luz do Sol. Nossa Terra, graciosamente, gira em torno dele. O sistema solar está em harmonia com outros semelhantes dentro da nossa Galáxia, que também não é única. Senhor, tão grandiosa é Vossa obra que não sabemos onde estão os seus limites, por mais que tentemos desvendar tal mistério.

Somos aprendizes e, nas sucessivas gerações, cometemos muitos erros. Temos sido intolerantes com os da nossa própria espécie, movidos pela cobiça, pela ganância ou por diferenças no modo de pensar. Dividimos a Terra em territórios, regidos por regulamentos, que muitas vezes dissimulam o domínio de nações sobre nações ou de governos e corporações sobre os indivíduos. Por vaidade, afrontamos a Natureza, subjugando-a em nome do progresso.

Como seres racionais, estabelecemos metodologias para o conhecimento, a isso denominando Ciência. Mas o conhecimento está tão fracionado, que já perdemos a noção do Todo. Muitos de nós queríamos mudar a Natureza e algumas tecnologias foram adotadas como deusas na mitologia da modernidade. Sim, nossos deuses são outros. Eles nos fascinaram pela promessa de bem estar, de mais tempo livre, de poder e de prestígio social. No entanto, nos cobram sacrifícios cada vez mais pesados. Por essas conquistas aparentes e pelo consumismo é preciso sacrificar a ética, o respeito entre os humanos e destes com a Natureza. Os outros deuses exigem de nós a pilhagem dos recursos naturais, como se fôssemos uma última geração aqui na Terra. Senhor, esses deuses querem ver poluídos o solo, a água, o ar e qualquer elemento que lembre a Vossa Criação. Na ânsia de dominação, utilizam seres humanos a quem conferem poder transitório, mas capaz de provocar profundas feridas na Terra. Muitos humanos inocentes foram seduzidos pelos novos deuses e ainda participam da orgia consumista. Nem a estabilidade do clima foi poupada. A Terra aquece perigosamente. Os véus brancos das neves nas montanhas derretem-se em enxurradas. Os gelos polares se liquefazem e aumentam o nível das águas oceânicas. As estações do ano estão indefinidas. Os ventos e as secas nos assolam cada vez mais em algumas áreas, enquanto as enchentes se intensificam em outras. Perdemos a noção de limites e as nossas cidades avançam sobre as paisagens, deformando-as. Ainda assim, queremos aniquilar as últimas florestas, conspurcar as águas e consumir futilidades.

Colocamos a nossa espécie acima das outras e não como integrante de toda a Criação. Nós ainda maltratamos os animais, privando-os da liberdade para o deleite egoísta. Destruímos santuários onde milhões de espécies viviam em harmonia. Existe uma só Verdade: os seres humanos, todas as formas de vida e a matéria componente do Universo são Vossa criação.

Já temos dificuldade em ouvir o canto das aves e o farfalhar das folhas ao vento. Os ruídos da civilização, com sua parafernália eletrônica, agridem nossos ouvidos. Já perdemos parte da audição e a capacidade de nos concentrar.

Os resíduos que geramos consomem recursos vultosos e a nossa saúde. Alguns são invisíveis, mas se espalharam pelo ambiente e circulam na cadeia vital de todos os seres. Podem induzir mutações genéticas, alterar nosso sistema hormonal e provocar estados depressivos.

Nossa Terra agoniza. É um ente vivo e seu estado é febril. Ela vai se livrar do seu agente patológico, restabelecendo os equilíbrios vitais. Quando isso ocorrer na sua plenitude, os agentes destruidores serão julgados pelo Tribunal da Natureza.

Se ainda for possível, rogamos a Vós, Criador do Universo, que nos conceda uma nova oportunidade. Cometemos muitas tropelias e Vos pedimos desculpas. Ainda resta em nós uma semente de humildade. Quem sabe um dia ela germine e permita a nós seres humanos, vermos o nascimento de uma nova Civilização, como parte da Natureza e não como o seu exterminador.




Foto: Web


Dia 22 de Abril: Dia da Terra. Texto de ABRIL 2006.

Elaborei o texto a pedido de simpatizantes do movimento ambientalista. Foram distribuídas cópias avulsas e também no jornal Folha de São Borja, na coluna de Alberi Cogo.